Avanços globais em sustentabilidade continuam, com ou sem Trump
- diogoalmeida76
- Mar 17
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O regresso de Donald Trump para um segundo mandato na Casa Branca tem levado a receios na transição energética global e na luta contra as alterações climáticas. Os EUA preparam-se para abandonar novamente o Acordo de Paris, enquanto a administração Trump tenta enfraquecer regulamentações ambientais, impulsionar a produção de combustíveis fósseis e eliminar incentivos às energias renováveis e aos veículos elétricos (VEs).
Ainda assim, nada disto será suficiente alterar os fundamentos da resposta global à crise climática ou para travar o avanço da transição energética. O mundo continuará a avançar – com ou sem a administração de Trump –, e as iniciativas de sustentabilidade continuarão a prosperar, por cinco principais razões.
Cidades e estados norte-americanos continuarão a apoiar a agenda sustentável
Apesar dos desafios impostos pelo governo federal, a liderança climática continuará a prosperar nos EUA através do compromisso dos governos locais e estaduais.
Durante o primeiro mandato de Trump, cerca de 300 estados e cidades norte-americanas — incluindo Nova Iorque, São Francisco, Los Angeles e Chicago — uniram-se em iniciativas como We Are Still In ("Ainda Estamos Dentro"), que garantiu a continuidade da ação climática sem apoio federal. Foi criada a U.S. Climate Alliance, reunindo 24 estados dos EUA e abrangendo 54% da população e 57% da economia do país, como um exemplo de cooperação para alcançar as metas do Acordo de Paris e fortalecer a resiliência climática. Estados progressistas mantiveram investimentos em infraestruturas verdes e transportes sustentáveis, contrariando a aposta da administração de Trump nos combustíveis fósseis. Nova Iorque destacou-se ao aprovar a Lei Local 97, uma legislação pioneira que impôs limites rigorosos às emissões de carbono em grandes edifícios.
Já em 2025, poucos dias após Trump assinar a ordem executiva para retirar os EUA do Acordo de Paris, o multimilionário Michael R. Bloomberg anunciou que a sua fundação filantrópica iria compensar a saída do país e garantir o financiamento à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC), assegurando a continuidade do compromisso climático global.
As energias limpas vão continuar a crescer nos EUA
Durante o seu primeiro mandato, Trump prometeu salvar a indústria do carvão e travar as energias renováveis, sem sucesso. A necessidade de cumprir regulamentos ambientais dificultou a operação das centrais a carvão, enquanto o vento, o sol e o gás natural se tornaram mais baratos e competitivos. De facto, nos últimos 15 anos, a maior parte das novas infraestruturas elétricas nos EUA tem sido dedicada à energia eólica, solar e baterias, setores que atualmente empregam centenas de milhares de pessoas.
As empresas elétricas nos EUA continuarão a investir em renováveis para garantir a estabilidade da rede elétrica e acomodar o crescimento do consumo energético, mesmo com a expansão de novas centrais a gás; os fabricantes de automóveis não abandonarão os seus planos de longo prazo para veículos elétricos, apesar da eliminação de subsídios e financiamento sob a administração Trump.
Se Trump tentar bloquear os investimentos em energia limpa, poderá enfrentar resistência até do próprio Partido Republicano. Muitos estados republicanos, como o Texas, apoiam as renováveis devido aos benefícios económicos, como empregos mais bem pagos e maior receita fiscal. De facto, em 2023, 18 republicanos assinaram uma carta de apoio à Lei de Redução da Inflação (IRA), reconhecendo os benefícios económicos e os empregos gerados pelas energias renováveis. Assim, mesmo com a oposição de Trump, a sua capacidade de reduzir investimentos será limitada pela maioria no Congresso.
Adicionalmente, a expansão de fontes de energia limpa é crucial para a inovação em áreas como a inteligência artificial e a indústria automatizada, que dependem de uma rede elétrica robusta e sustentável. Será que Trump irá prejudicar o crescimento de setores que considera vitais para o futuro dos EUA?
A China continuará a impulsionar a transição global
A China, o maior emissor de carbono do mundo, será um fator decisivo. O país, que mantém o compromisso ambicioso de atingir a neutralidade carbónica até 2060, tem expandido rapidamente a sua capacidade de produção de energias renováveis e reduzido custos no setor.
Como maior produtor mundial de painéis solares, turbinas eólicas e baterias, a China está a tornar a energia renovável mais acessível a outras nações, especialmente em mercados emergentes. Em 2024, pela primeira vez, as energias limpas representaram mais de 10% do PIB da China, com vendas e investimentos a alcançar os 13,6 biliões de yuan (1,9 biliões de dólares). Este setor contribuiu com 26% do crescimento económico do país.
Adicionalmente, o seu avanço no setor de veículos elétricos (EVs) está a acelerar a substituição dos combustíveis fósseis. Em 2024, a produção chinesa de EVs subiu 34%, com 13 milhões de unidades fabricadas, e as exportações aumentaram 6,7%. As marcas chinesas foram responsáveis por 62% das vendas globais de veículos elétricos.
Em dezembro de 2024, a China introduziu ainda os primeiros padrões para divulgação de sustentabilidade corporativa, com o objetivo de ajudar as empresas a alinhar as suas práticas empresariais com expectativas globais de ESG, com implementação total prevista para 2030.
O impacto para as empresas
Para as empresas, a adaptação às mudanças é essencial para a conformidade, a resiliência e a competitividade a longo prazo. Mais do que cumprir regulamentações, investir em práticas sustentáveis reduz riscos operacionais, melhora a eficiência energética e reforça a confiança de clientes e investidores num mercado cada vez mais exigente.
Segundo o estudo Sinais Sustentáveis da Morgan Stanley, 77% dos investidores globais (84% nos EUA e 85% na Europa) mostram interesse em investir em empresas que, além de procurar retornos financeiros, promovem um impacto social e ambiental positivo. Adicionalmente, as instituições financeiras exigem uma crescente transparência em relação aos riscos climáticos e ambientais, o que confere às empresas que adotam práticas sustentáveis acesso preferencial a financiamento.
Num futuro onde a sustentabilidade será cada vez mais um diferencial competitivo, as empresas que priorizam a responsabilidade ambiental e social estarão mais bem posicionadas.
O risco climático moldará os mercados
Finalmente, negar as mudanças climáticas não impede os seus impactos. Continuamos a assistir, um pouco por todo o mundo, ao aumento da frequência e gravidade de fenómenos como ondas de calor, cheias e incêndios, que causam prejuízos económicos, ambientais e sociais sem precedentes.
Entre 1980 e 2020, morreram na União Europeia mais de 138 mil pessoas devido a eventos meteorológicos e climáticos extremos. Em 2024, A Europa foi palco de três dos dez desastres climáticos mais caros do mundo; a tempestade Boris, na Europa Central, e as inundações em Espanha e na Alemanha causaram danos de 13,5 mil milhões de euros e resultaram em 258 mortes.
Nos Estados Unidos, os desastres naturais causaram mais de 2,7 biliões de dólares em danos desde 1980. A intensificação dos desastres climáticos nos EUA levou os custos dos seguros a dispararem, como na Flórida, onde os prémios aumentaram quase 60% entre 2019 e 2023. A Ásia e África enfrentam algumas das secas mais graves da história e desastres climáticos devastadores. O ciclone Chido, que atingiu Mayotte, causou mais de mil mortes, enquanto as inundações na África Ocidental afetaram mais de 6,6 milhões de pessoas, com destaque para países como Nigéria, Chade e Níger.
Se a economia global seguir seu curso atual, as temperaturas continuarão a subir, gerando riscos cada vez maiores, migração climática crescente e custos mais elevados.
O caminho é em frente
Os avanços em sustentabilidade e a transição energética global são impulsionados por fatores estruturais, inovações tecnológicas e dinâmicas económicas que continuarão a acelerar, mesmo diante de desafios como os impostos pela administração de Trump.
Por mais exigente que seja o caminho, este não é o momento de recuar, mas sim de redobrar esforços e seguir em frente com compromisso e determinação.
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