Na ótica da gestão do risco, diria que nos faz muita falta ter uma taxonomia de adaptação. Talvez não seja tão premente na Europa, mas sem dúvida que para países africanos, esta pode ser mais interessante para o país e para o próprio setor finance.
Na Europa desenvolveu-se a chamada taxonomia verde, que identifica os critérios científicos que devem verificar-se para que uma certa atividade seja considerada como alinhada com a descarbonização em 2050, i.e., para que seja considerada verde. Os bancos têm já, em 2024, de reportar a percentagem de empréstimos “verdes” que concederam às grandes empresas, tendo as empresas cotadas em bolsa de reportar, em 2024, o seu alinhamento com a taxonomia, ou seja, de que forma estão alinhadas com a necessidade de serem neutras em carbono em 2050.
Vários outros países no mundo, incluindo em África, estão a criar as suas próprias taxonomias verdes, identificando-se assim as componentes técnicas que devem estar presentes em setores para que se possa afirmar que a atividade em questão terá o menor nível de emissões de CO2 aceitável.
Na Europa, esta decisão de se ter uma taxonomia verde está associada à ideia de que empresas com poucas emissões de CO2 terão menos risco climático de transição, uma vez que serão menos sujeitas à regulação sobre emissões, serão mais aceites pelo mercado, terão produtos mais inovadores e menos risco, e serão mais atrativas para o setor financeiro.
No entanto, e ainda na ótica da gestão do risco, diria que nos faz muita falta ter uma taxonomia de adaptação. Talvez não seja tão premente na Europa, mas sem dúvida que para países africanos a taxonomia de adaptação pode ser mais interessante para o país e para o próprio setor financeiro.
Na realidade, em África, e de certa forma em Portugal, os principais riscos climáticos decorrerão dos impactes que as cheias, secas, ondas de calor, incêndios e furacões, entre outros fenómenos naturais, terão nas infraestruturas, edifícios, agricultura, turismo, indústria e serviços, entre várias outras atividades.
Assim, é importante garantir que investimentos realizados hoje serão resilientes aos impactes climáticos que vamos sentir dentro de cinco, dez e 20 anos. Caso contrário, podemos estar a realizar investimentos hoje que ficarão destruídos em breve, e, isso sim, constitui um risco para os credores e investidores.
Os países e as empresas, além de deverem identificar os seus investimentos em tecnologia e processos que levem à diminuição das emissões de gases com efeito de estufa, e cujas orientações para tal estão definidas na taxonomia verde, devem ainda comunicar de que forma os seus investimentos serão resilientes aos impactes das alterações climáticas que irão acontecer quando a temperatura mundial aumentar mais de 2ºC. Isto significa que, dependendo do país em questão estar ou não sujeito a mais riscos climáticos físicos, uma taxonomia de adaptação irá ter uma importância maior.
Já existem alguns trabalhos a nível internacional sobre a identificação das tecnologias de adaptação que podem ser aplicadas a vários setores. Por exemplo, se num país se estima que os ciclones serão cada vez mais frequentes e fortes, é necessário saber se a fachada de um novo edifício a construir será resistente aos ventos ou se corre o risco de destruição significativa. Esta, sim, será a leitura necessária para que os bancos realizem bem as suas análises de risco.
É, pois, necessário que os países desenvolvam guias de técnicas e tecnologias sobre como é que os edifícios, as infraestruturas, a agricultura, a floresta, entre muitos outros ramos de atividades, podem evidenciar que são resilientes às mudanças climáticas. É necessário que tudo isto seja ensinado nas universidades, para que os engenheiros e arquitetos possam pensar no desenho de opções que acautelem os cenários climáticos futuros.
Toda esta narrativa que acabei de referir faz mais sentido tendo em conta o Roteiro Nacional para a Adaptação 2100, cofinanciado pelos EEA Grants e apresentado em maio passado. Este estudo foi promovido pela Agência Portuguesa do Ambiente e contou com o envolvimento da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, da Direção-Geral do Território, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, do Banco de Portugal e da Direção Norueguesa de Proteção Civil.
O Roteiro vem atualizar o conhecimento a nível de cenários climáticos e respetivos impactes para diferentes regiões e em setores chave, o que significa a identificação da necessidade de valorizarmos cada vez mais os projetos que acautelam a sua adaptação aos impactes ambientais futuros.
Num país como Portugal, com elevado risco climático e um dos países europeus que mais vai sofrer com as alterações climáticas, faz sentido desenvolver-se um plano de ação para garantir a resiliência das infraestruturas e dos setores essenciais à economia portuguesa, definindo-se os critérios técnicos que garantem essa adaptação.
Artigo.
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